FREAK SHOW

Perdoem a fase muro-das-lamentações, mas tem um ou duas coisinhas mais que eu queria tirar do meu peito.

Vocês já sabem tudo sobre a minha relação deturpada com os homens e o quanto isso já me fez sofrer. E rir também.

O que eu não falo muito aqui é do quanto as minhas fraquezas estéticas têm me importunado ao longo da vida.

Não que eu tenha algum dia sonhado em ser linda. Mentira, já quis ser deslumbrante, sim. Mas só até aquele momento em que eu descobri que as baixas expectativas são o verdadeiro caminho da felicidade.

Eu até toparia usar a capa da Juliana Paes para ferver uma noite qualquer, mas não sei se aguentaria viver permanentemente presa a um corpo que despertasse tanta luxúria e fantasia nos homens, para quem uma mulher dessas sempre vai ser uma decepção na cama. Não tem como corresponder aos sonhos molhados dessa gente. Tá...modo de dizer.

Numa troca a longo prazo eu preferia a aparência da Cate Blanchet ou da Halle Berry que, além de sexies, valorizam todo e qualquer figurino. Em cena ou em tapete vermelho. E agradar roupas é sempre mais garantido do que agradar só os homens.

Mas não era disso que eu falava. Eu contava de como eu já deixei há muito de sonhar com o ideal de perfeição física. Acho que desde que eu descobri que sendo, digamos, esteticamente alternativa, eu podia cativar um eleitorado que me validasse como gostosa.

E fui vivendo.

Até que lá nos fins dos meus 26 anos, malhadíssima, saída de um relacionamento eterno, louca para chafurdar na lama, sou acometida por um tenebroso e implacável surto de acne tardia. Minha cara virou uma peneira em menos de um mês.

Como sempre, as pessoas conseguem fazer com que tudo fique ainda pior: "O que está acontecendo com seu rosto? Já usou chá de alho?Pára de estourar!". Não dá muito para ficar explicando síndrome dos ovários policísticos para gente rasa assim que acha que tudo sempre é culpa nossa.

Pois eis que o médico que salvou a minha vida é um dermatologista. Mas o tratamento me fez engordar tanto tanto tanto. Só pra ouvir: "Parou de malhar? Tá grávida?"

E a dieta para emagrecer ( "Vai sumir, garota!") me fez perder mais ou menos um terço dos meus cabelos, que eu precisei cortar curtinhos para continuar ouvindo toda sorte de crítica. Como seu eu tivesse muita escolha. A Elba Ramalho ligou e pediu a peruca de volta, sorry.

Quando eu já me acostumava a ser mulher sem véu, o veredito: "Você está ficando dentuça e precisa corrigir isso agora. É muito perigoso manter os dentes desalinhados na sua idade. É que nas mulheres, a perda óssea..."

E ataram grilhões à minha boca. "Mas na sua idade? Ainda tem jeito?"

Eu já sei que a próxima batalha são as rugas. E que essa certamente eu vou perder. Tudo bem desde que eu não perca a guerra contra essa gente sem tato que parece encontrar enorme prazer em me fazer sentir menor.

Não é como uma amiga dizendo que meu cinto não combina com sapato. Ela sabe que o look é resultado de uma escolha minha e que ele vai durar, no máximo, um dia.

É perversidade de espírito de porco é muito injusto que isso fique impune.

Aliás, dá vontade até de estampar umas camisetas delicadas para dizer ao mundo: "Ok, estou feia mas posso melhorar. Mas e você que não tem coração?"

Isso sim é ser uma aberração.