
Toda contagem regressiva tem o poder de me deixar nervosa e obssessiva.
Como professora, fui me acostumando a contar e controlar o tempo a um ponto em que quase me sinto brincando de Deus.
Hoje, verificando a minha expressão impaciente diante de um novo artefato desconfortável, minha ortodontista de súbito assumiu a aparência de alguma espécie de mestre zen-budista para mandar na lata:
-O que mais atrapalha o meu trabalho é justamente isso. As pessoas parecem que simplesmente esqueceram do que é se engajar num processo. Querem tudo para ontem.E eu me pus a pensar, diante mesmo até das críticas gerais aos meus
posts curtos em série, no quanto eu me sinto enterrada nessa existência
multitasking que só permite a ilusão de se estar realizando muito sem que se perceba, de forma concreta, nenhum resultado palpável.
Tá todo mundo correndo atrás não se sabe nem muito bem de quê.
Pessoalmente me vejo perder o gosto da expectativa da festa, dos mistérios da pessoa nova e da tristeza pela proximidade do fim do livro. E eu estou falando de sensações que orientaram os maiores prazeres da minha vida. Não lembro mais da última vez que eu sentei no bar sem ser bombardeada por questionamentos gravíssimos do tipo
pra-onde-a-gente-vai-depois.
E assim a vida vai passando. Sem que eu consiga, muitas vezes, elaborar um pensamento decente sem precisar chamar a atenção de algum aluno voador, já portador de algum diagnóstico psicossomático que explica em duas linhas porque ele não aprende nada.
E o resultado disso é que, bem como a aprendizagem, outros processos acabam abortados pelo meio em função da necessidade imediata de confecção de um laudo qualquer. Tem gente, por exemplo, que não viveu ainda nenhuma forma de perda. Para quê, se existe fluoxetina?
"
Pra quê?" , no fim das contas, acabou se tornando uma expressão nitidamente sabotadora daquelas novas experiências que tão importante papel desempenham na nossa formação como seres humanos.
Aliás, pra quê a foto do Police? Pra lembrar um pouco de como é gostoso digressionar e para avisar que eu vou de
gramado, não esqueçam!
E pra deixar bem claro que a espera não precisa só fazer sofrer.